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Sentado em meu escritório, interessei-me por um texto que, ao acaso, encontrei na internet. Nele, o professor Dagoberto José Fonseca, docente da Faculdade de Ciências e Letras, Campus UNESP/Araraquara, discute a questão da escravidão e o tráfico de grandes contingentes populacionais de africanos para diversas partes do mundo. No comentário, o estudioso demostra que não houve uma escravidão, mas distintos processos de expropriação sistemática de um homem sobre outro e de uma sociedade sobre outras. Houve escravidões conduzidas por alianças construídas comercialmente, entre grupos autóctones e estrangeiros.

O professor Dagoberto José comenta ainda que a imposição chegou ao ponto dos conceitos ideológicos adotados pelo colonialismo e pelo neocolonialismo atribuírem ao africano as marcas da inferioridade, da infantilidade e da incapacidade de gerir a própria existência social, política, econômica, cultural, mediados pela paz e não pelos conflitos antigos.

Passava da meia noite. Sob os efeitos de um vinho branco, e tendo à minha frente uma máscara africana antiga, adquirida em São Paulo em uma feira internacional de artesanato, fui tomado de uma estranha sensação de iminente arrebatamento.

De repente, imaginei ter ouvido um gemido raspado, gutural, vindo da parede em frente. Levantei o olhar um pouco acima do computador e tive a sensação, quase certeza, de que aquele ruído estranho viera daquela máscara que me encarava de frente. Nela, o belo rosto de uma princesa pertencente a uma tribo perdida em algum ponto do continente africano de repente pareceu mexer-se. E, tal qual um eflúvio, transfigurara-se em minha direção, sem se deter com minha cara de puro espanto, em uma atitude de provocação.

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Naquele momento, uma imagem da infância em Areia Branca fluiu em minha mente, imagino que para me acalmar. Era a parede branca do quarto de Haroldo, meu vizinho da Rua da Frente, justo o menino que queria ser paraquedista. É que em um dia de Natal Haroldo entrou correndo em minha casa nos chamando para ver as marcas dos pés de Papai Noel na parede do seu quarto, quando ele ali estivera durante a madrugada. Na cama, um presente deixado pelo velhinho. Acho que exagerei nas taças do vinho, pensei.

Pelo sim pelo não, no dia seguinte, um sábado marcado por extensos nevoeiros que encobriam boa parte de Brasília,  um destino final àquela máscara. De longe, na parede da mansão das máscaras, uma olhada para trás e a sensação de que um olho triste piscava para mim.

Máscara de uma princesa africana. Hoje, fazendo parte do acervo pessoal de um  amigo colecionador, este sim, senhor de todas as máscaras.

EvaldOOliveira

Sócio Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do RN

Nunca entendi a insistência e o desespero de minha mãe naquela manhã em que eu tive que praticamente ser arrastado para meu primeiro dia de aula no Círculo Operário, que ficava na mesma quadra em que eu morava. Lá, descobri-me capaz.

Nunca entendi por que Papai Noel só trazia para mim um balão de soprar, desses de aniversário, que as crianças estouram no final da festa.

Nunca entendi por que apenas algumas pessoas de Areia Branca têm noção dos movimentos da cruviana, se sabemos que ela surgia dos lados do rio e tomava conta de toda a cidade, feito uma bruma invisível.

Nunca entendi por que passei minha meninice sem conseguir comprar uma bicicleta, sonho de consumo. Passear pela Rua do Meio, pedalando contra o vento naquelas tardes domingueiras, quando boa parte da meninada estava no Cine São Raimundo assistindo às séries de Nyoka, de Tarzan ou vendo filmes de Durango Kid.

Nunca entendi por que o sal marinho é retirado do rio, cuja água é doce, e não do mar, que sempre imaginei repleto de todos os sais. Nem por que o sal, que é transportado pelo rio, não se mistura às suas águas.

Nunca entendi por que Barra e Pernambuquinho, que ficam do outro lado do rio Ivipanim, são localidades desconhecidos de boa parte dos areiabranquenses da minha geração.

Nunca entendi por que, justo naquele dia, naquela hora crítica, fui orientado por uma voz interna soprando em meu ouvido, pelo lado de dentro, com o toque da alma, que me dizia: Vai e tira seu carro dali, agora. Fiz o que me fora mandado. Segundos depois, um acidente ocorreria, quando uma árvore caiu exatamente local em que estava meu automóvel que eu acabara de retirar. Naquele exato momento lembrei-me de minha mãe.

Nunca entendi por que em Areia Branca havia serração, uma tradição portuguesa da Idade Média, e não tinha cerração, fenômeno meteorológico que vim conhecer em 1971, no interior da Bahia, quando da minha primeira grande viagem, no rumo de Brasília, ainda estudante do curso médico, para avaliar a possibilidade de minha Residência Médica em Pediatria. Ali, a emoção do encantamento.

Nunca entendera, até que a aura da paz e do entendimento estendessem seus tentáculos benfazejos sobre mim.

EvaldOOliveira

Sócio Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do RN

 

 

 

Minhas ideias sobre Papai Noel remontam à minha infância. Quando se aproximava a época de Natal havia um grande alvoroço no meio da molecada. Cada um, a seu modo, ficava imaginando o presente que o bom velhinho traria naquele final de ano, como acontece até hoje. E, como hoje, a noção do real significado da data festiva sequer era ventilada. Somente depois, já maiorzinhos, tais noções eram recebidas na igreja matriz, entre novenas e missas.

Na manhã do dia 25 a meninada saía às ruas para exibir seus presentes, geralmente coisas simples. Os poucos que ganhavam bicicleta – com ou sem rodinhas – tinham um prazer especial nesse processo de demonstração.

Outra parte da criançada saía para curtir os presentes dos outros, com aquele olhar de cabra morta. Em minha casa éramos nove, cada um com seu balão (desses de aniversário) que Papai Noel colocava debaixo das redes. Era uma curtição, justo pelo balão.

Dá até para imaginar o que acontecia com as crianças bem mais humildes, que sequer recebiam o carinho dos pais. Já escrevi aqui sobre a alegria de Haroldo, o menino que queria ser paraquedista, ao nos convocar para ver os riscos dos pés do Papai Noel na parede do seu quarto. Uma euforia quase histérica.

O tempo pegou carona com as renas e voou, e no natal de 2015 encontrou-me como o vovô Dado, de cabelos brancos e tudo mais. Na noite deste último natal, antes da ceia, todos na sala, pura algazarra, e eu no quarto me metamorfoseando. Logo o bom velhinho apareceria na sala, com seu sotaque portunhês e óculos de antigamente, hoje desnecessários. Meu neto ficou estático, com os olhos fixados naquela figura humana que ele adora. Em um minuto estava sentado no colo do Papai Noel, debulhando uma conversa franca, prometendo cumprir todas as ordens, sugestões e orientações ali repassadas. Um sucesso. Mas ele não tirava os olhos do meu pé direito.

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No dia seguinte, alguém mostrou para o meu neto a foto em que ele aparecia segurando a mão do Papai Noel. De pronto, Paulo José falou:

– Da outra vez eu quero um Papai Noel original, porque esse aí é o outro vovô Dado.

Ele tem apenas dois anos e sete meses.

Eu, de Papai Noel, nunca mais!

maio 2024
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