You are currently browsing the tag archive for the ‘igreja matriz’ tag.
Quero um canto novo, que traga de volta um passado sem cheiro de naftalina, sem pucumãs se esgueirando pelas cumeeiras, mas com sabor de cocada de rapadura e puxa-puxa.
Quero um canto novo, que fale de infância, de banho de bica, de mergulhos na maré cheia, com aquele gostinho de pitomba que todos conhecemos, e que encantou a nossa meninice em Areia Branca.
Quero um canto novo, que fale de desencontros, amores perdidos, mas que a alma se eleve à grandeza do ser.
Quero um canto novo, onde as pessoas encaminhem correios elegantes (hoje seria Whatsapp), como os que aconteciam junto à barraca de Zacarias, e que a resposta venha com um sorriso ou um beijo.
Quero a alegria dos parques de diversão, com o encanto daqueles ao lado do Palacete Municipal, a música rolando livre, as pessoas se confraternizando, trazendo na mão um rolete de cana ou a maçã do amor, ao tempo em que discutiam quem será melhor no tiro ao alvo.
Quero um canto que nos envolva tanto quanto as novenas que antecediam a Festa de Nossa Senhora dos Navegantes, uma chance para que o Zorro nos brindasse com sua presença benfazeja.
Quero um canto novo, com as badaladas do sino da igreja anunciando mensagens de fé e esperança.
Quero um canto que fale de uma liberdade conquistada, como fazem as areias das dunas, ocupando espaços, momentos e lugares à revelia das normativas formais.
Quero um canto que traga a aura dos manguezais, o encanto das salinas e o sabor quase sonho de um suco de cajá.
Quero um canto novo, com o encantamento das missas dominicais na igreja matriz, com a cobrança da frequência na segunda-feira, no Círculo Operário, no início da aula.
Afinal, um canto novo, cheio de esperança, momentos de luta e transformação, e que nos traga paixão à alma.
Porque depois da pandemia um mundo novo nos espreita, seletivo e exigente.
–
EvaldOOliveira
Sócio Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do RN
“[…] Eu sei que você já viu um pé de goiaba, um pé de laranja e um pé de manga. Pode até ter plantado algum no quintal da sua casa […] Mas suponho que você nunca viu um pé de saudade. […]”
O trecho acima está no livro “PORTO FRANCO”, a mais recente obra do escritor areia-branquense Chico de Neco Carteiro, a quem, no meio literário, insistem em chamar de Francisco Rodrigues da Costa. Porto Franco é o retorno de Chico ao seu memorialismo apaixonado e puro, carregado de saudade, após ter ele se enveredado em dois romances: Perdão e Guanabara. Quando muitos pensavam que se haviam esgotados todos os dizeres do memorialismo areia-branquense, mais uma vez com o selo da Editora Sarau das Letras, o escritor reaparece com suas crônicas encantadoras, falando sobre o antigo porto que marcou época na região da Costa Branca. O lançamento ainda não tem data definida. Mas, quando chegar a hora, vale a pena conferir.
Abaixo, recortes da crônica “A Igrejinha da Barra”, de Porto Franco.
“A IGREJINHA DA BARRA
Do patamar da nossa igreja matriz em Areia Branca, avistava-se, no outro lado da maré, uma capelinha branca. Um belo quadro. Mas, para que os areia-branquenses desfrutassem dessa paisagem, foi preciso a iniciativa de Chico Amâncio, morador da Barra. Ele podou uma área do manguezal que encobria a capelinha. […]
[…]
Dia desses eu estava em Areia Branca. Um sábado. Tomei conhecimento que o meu amigo Dom Marcelo iria cantar a Ave-Maria de Schubert num programa musical intitulado: Projeto “Pôr do Sol”. Justamente na hora em que a Estrela-mor nos abandona e vai iluminar a outra parte da Terra.
Fui prestigiar o filho de Manoel de Marina. Cheguei cedo, antecipando-me ao salmista oficial da paróquia, nomeado pelo padre César.
Enquanto isso, do patamar da igreja, eu procurava ver a Igrejinha da Barra. Não conseguia, os mangues me impediam. A Capitania dos Portos, numa preservação ao meio ambiente, não permitiu que outro Chico Amâncio podasse o manguezal.
[…]
Finalmente, a apresentação. Além dos aplausos do público, Dom Marcelo recebeu calorosas palmas de uma turista francesa, acompanhadas do incentivo:
─ Bravo, monsieur.”
(*) Os grifos em negrito são nossos.
A igreja matriz de Areia Branca sempre fez parte de nossos interesses e vivências desde quando ainda pequeninos. Quase todos nós fomos ali batizados, e muitos de nós retornamos à nossa referência como casa de oração logo que pisamos o solo areiabranquense. É sempre a primeira visita.
De nossas casas ouvíamos as batidas do sino da velha igreja a nos convocar para os eventos religiosos. Em outros momentos, três batidas em sequência nos comunicavam que alguém havia morrido. A primeira era grave e longa, seguida de dois toques curtos e agudos. Saber quem fora tornava-se a conversa daquele dia, fosse em casa, no trabalho ou na rua. Logo a cidade inteira seria informada por quem os sinos dobravam.
Muitas escolas da cidade – como o Círculo Operário – chegavam a exigir que seus alunos frequentassem a missa aos domingos, e logo na segunda-feira cada escola sabia quem havia faltado.
Sempre achei a frente da igreja – frontispício – com cara de esfinge, seja por sua sisudez ou pela postura serena na beira do cais, tomando conta do rio Ivipanim e do manguezal que o protege dos dois lados.
Pela primeira vez tenho em mãos uma foto reveladora. O telhado de nossa igreja
Reproduz perfeitamente o formato de cruz. Uma grande cruz que abençoa uma cidade planejada desde o início. Mas este fato somente agora vem demonstrar a preocupação dos construtores da nossa igreja.
Em Brasília, o rabisco de uma cruz em forma de avião, e o primeiro cruzamento. A cidade.
Em Areia Branca, a descoberta de uma cruz no alto da igreja, que nos encanta, em uma cidade igualmente planejada. A paz.
–
EvaldOOliveira
Sócio Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do RN